Mosaico do Baixo Rio Negro

O Mosaico do Baixo Rio Negro abrange um território de mais de 8 milhões de hectares onde existe um conjunto de UCs de proteção integral e uso sustentável.

A Amazônia abriga a maior floresta tropical do mundo e contém um terço de todas as florestas tropicais remanescentes. A região, compartilhada por nove países sul-americanos, ocupa quase a metade do território brasileiro – 4,1 milhões de km2 – e é cortada por mais de mil rios, formando a maior bacia hidrográfica do planeta. Ela também guarda uma enorme quantidade de carbono, possui uma imensa riqueza biológica, com milhões de espécies – muitas das quais ainda desconhecidas da ciência – e tem uma riqueza cultural igualmente diversa, com populações tradicionais e indígenas de longa e rica tradição no convívio com a floresta. Esse imenso patrimônio possui programas de conservação à altura dos desafios e necessidades da gigantesca região que o abriga.
A Lei nº 9.985 instituiu em 18 de julho de 2000, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC, que define em âmbito geral, quais são as categorias de UC’s, seus objetivos e a forma de gestão. Assim foram criadas duas grandes classes de UC’s: Unidades de conservação de proteção integral (UCPI) e Unidades de conservação de uso sustentável (UCUS).
A região do Baixo Rio Negro insere-se no Corredor Ecológico Central da Amazônia, maior área de proteção ambiental contínua do mundo. A importância ecológica e social dos ecossistemas do Baixo Rio Negro é evidenciada pela grande diversidade biológica o que lhe confere a classe de área de extrema importância para conservação segundo o Relatório “Biodiversidade Brasileira” (MMA, 2002).
O território do CCA abriga em seu interior a Reserva da Biosfera da Amazônia Central, com cerca de 20 milhões de hectares, e o Sítio Natural do Patrimônio da Humanidade Complexo de Conservação da Amazônia Central, com cerca de 6 milhões de hectares, reconhecido ela UNESCO em 2003 com a incorporação do PARNA de Anavilhanas, RDS Amanã e parte da RDS Mamirauá ao Sítio Natural do PARNA do Jaú, reconhecido desde 2000 (UNESCO .d.). As três estratégias de gestão territorial reforçam “a relevância mundial dessa região e a urgência de ações concretas de conservação e desenvolvimento sustentável” (MMA 2007a: 49).
Reservas da biosfera são sítios estabelecidos pelos países e reconhecidos pelo Programa O Homem e a Biosfera (Man and Biosphere – MAB) da UNESCO. O MAB é um programa científico intergovernamental criado em 1971 que tem como objetivo reconciliar a conservação biológica com a diversidade cultural e o desenvolvimento social, através de parcerias entre a sociedade e o ambiente. Atua através de uma agenda de pesquisas interdisciplinares e de um programa de capacitação voltado às dimensões sociais, ecológicas e econômicas da biodiversidade (UNESCO 2012).
Os sítios reconhecidos como Reservas da Biosfera são globalmente considerados: 1) sítios de excelência, onde novas práticas de gestão das atividades humanas e manejo da natureza são testadas e demonstradas; 2) ferramentas para auxiliar os países a implementar os resultados das Conferências Mundiais para o Desenvolvimento Sustentável, em particular a CDB; e 3) sítios de aprendizagem para a Década da ONU sobre Educação e Desenvolvimento Sustentável (UNESCO 2012a). Podem ser considerados uma importante ferramenta para o ordenamento territorial, manejo da paisagem e conservação da biodiversidade, em função do reconhecimento internacional a eles atribuído.
De acordo com o SNUC e as diretrizes da UNESCO, as Reservas da biosfera possuem três zonas distintas: 1) Zonas-núcleo: destinadas à proteção integral, formadas por UCs legalmente instituídas; Zonas de amortecimento: áreas que envolvem as zonas-núcleo, onde são permitidas atividades econômicas que não coloquem em risco a integridade das zonas-núcleo; e Zonas de transição: áreas mais externas da reserva, não possuindo limites rígidos, onde se incentiva o uso sustentável da terra como forma de promover a recuperação ambienta.
A Reserva da Biosfera da Amazônia Central (RBAC) foi reconhecida pela UNESCO em setembro de 2001 em uma vasta região de influência dos rios Negro e Solimões e transição para o planalto das Guianas, onde existem diversas áreas protegidas. De acordo com a UNESCO, uma das principais funções da RBAC é a integração destas áreas sobre diferentes regimes administrativos, de forma a permitir a cooperação de diferentes atores para o objetivo comum de conservação, proteção das áreas de remanescentes florestais e apoio o reconhecimento do conhecimento tradicional local (UNESCO 2011). A Reserva tem por elemento estrutural de seus territórios o conjunto de UCs contínuas, formado pela REBIO Uatumã, PARNAs do Jaú e de Anavilhanas, ESECs Javari-Solimões e Juami-Japurá, RESEX do Unini, FLONA de Tefé, RDS Mamirauá e Amanã, Parque Estadual do Rio Negro, APAs das Margens Esquerda e Direita do Rio Negro, entre outras de menor extensão territorial. O Conselho Estadual da Reserva da Biosfera da Amazônia Central (CERBAC), de caráter deliberativo, foi instituído pelo governo do Amazonas em junho de 2005, pelo Decreto N. 25.042 (GTA n.d.), com 24 membros, e atua também como comitê gestor do CCA (ICMBio 2011: 52).
Os Sítios Naturais do Patrimônio da Humanidade são reconhecidos pela UNESCO desde 1972 e considerados como pertencentes a todos os povos do mundo, resguardada a soberania dos países em que se encontram. O reconhecimento deve ser solicitado pelo país signatário e, uma vez reconhecidos, toda a comunidade internacional deve cooperar com a proteção destes sítios (UNESCO 2012b).
A região do Baixo Rio Negro é composta por um mosaico de áreas protegidas, o que afirma a importância da conservação dessa região, e a necessidade de envolvimento com a sociedade local, que deve ser fortalecido por meio da integração entre a gestão dessas áreas protegidas: Parques Estaduais (Rio Negro - Setor Norte e Setor sul), Áreas de Proteção Ambiental (APA Estadual da Margem Esquerda do Rio Negro - Setores Aturiá-Apuazinho e Tarumã Mirim - Tarumã Açu, APA Estadual da Margem Direita do Rio Negro - Setor Puduari-Solimões), Reservas de Desenvolvimento Sustentável (Municipal, RDS do Tupé, e Estadual, RDS Amanã), Parques Nacionais (PARNA do Jaú e PARNA Anavilhanas) e uma Reserva Extrativista (RESEX do Unini).
O Mosaico do Baixo Rio Negro (MBRN) foi reconhecido pelo MMA através da portaria N. 483, de 14 dezembro de 2010 (MMA 2010). O MMA propôs a criação e implementação de mosaicos nos biomas brasileiros para melhorar a eficiência e representatividade das áreas protegidas no que concerne à carência de recursos humanos e financeiros, ao isolamento das áreas protegidas em termos de gestão e proteção, e à repartição justa dos benefícios da criação destas áreas com os povos tradicionais que vivem em seu interior ou entorno (MMA 2007b, Cardoso et al. 2009). O MBRN abrange um território de mais de 8 milhões de hectares onde existe um conjunto de UCs de proteção integral e uso sustentável criadas nas esferas municipal, estadual e federal em diferentes momentos e contextos (FVA 2005; 2011), conforme representado pela figura 1.
Integram o MBRN as seguintes UCs e respectivas zonas de amortecimento (MMA 2010): na esfera federal, sob gestão do ICMBio: 1) PARNA de Anavilhanas; 2) PARNA doJaú; e 3) RESEX do Unini; na esfera estadual, sob a gestão do CEUC/SDS: 4) Parque Estadual do Rio Negro – setor Sul; 5) Parque Estadual do Rio Negro – setor Norte; 6) APA da Margem Direita do Rio Negro – setor Puduari-Solimões; 7) APA da Margem Esquerda do Rio Negro – setor Aturiá-Apuauzinho; e) APA da Margem Esquerda do Rio Negro – setor Tarumã-açu- Tarumã-mirim; 8) RDS Rio Negro; e 9) RDS Amanã; na esfera municipal, sob gestão da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMA) da Prefeitura de Manaus: 10) RDS do Tupé. Veja Figura Abaixo.
O reconhecimento do MBRN foi proposto por um projeto do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ) submetido ao Fundo Nacional de Meio Ambiente em 2005. Este projeto teve como objetivos envolver os atores sociais na gestão participativa do território, e elaborar e implementar um plano de desenvolvimento territorial com bases conservacionistas, promovendo a conservação da biodiversidade in situ, a valorização da diversidade sociocultural e o desenvolvimento territorial (Cardoso et al. 2009). Desde que o projeto foi proposto em 2005 até março de 2011, quando ocorreu a última oficina de capacitação do MBRN na comunidade Lago das Pedras, da RESEX do Unini, foram realizadas diversas ações de mobilização promovidas pelo IPÊ e demais parceiros em “espaços participativos trans-escalares, envolvendo a sociedade civil, comunidades tradicionais, Estado, municípios e empresas a nível local e instituições a nível regional e nacional” (Cardoso et al. 2009: 1).
Estas ações incluíram reuniões, seminários, cursos e oficinas de capacitação que contaram com a participação dos gestores das UCs, representantes de governo, ONGs, associações e moradores das comunidades locais.Este processo participativo de constituição do mosaico promoveu uma mobilização social e institucional no município de Novo Airão, sede das principais UCs do Baixo Rio Negro.
O Conselho Consultivo do MBRN se constitui como a instância máxima do mosaico, caracterizado como um fórum político, democrático e representativo de discussão e articulação. É composto por 28 cadeiras (14 titulares e 14 suplentes), seis representantes dos órgãos gestores conforme a seguinte distribuição das UCs federais, estaduais e municipais (dois titulares e dois suplentes para cada esfera de governo); um representante dos povos indígenas da região (titular: Associação Comunidade Waimiri Atroari – ACWA, suplente: Programa Waimiri Atroari); um representante do Conselho Estadual da Reserva da Biosfera da Amazônia Central – CERBAC (titular: Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas – IPAAM, suplente: Grupo de Trabalho Amazônico – GTA); quatro representantes de organizações de base atuantes na região de influência do mosaico, que foram divididas em associações comunitárias (titulares: Fórum Permanente de Defesa das Comunidades Rurais do Município de Manaus – FOPEC, Associação das Comunidades Sustentáveis do Rio Negro – ACS e Associação dos Moradores do Rio Unini – AMORU; suplentes: FOPEC, ACS e Associação dos Moradores do PAREST do Rio Negro – setor Norte – AMPERNSN) e municipais (titular: Associação de Pescadores de Novo Airão – APNA, suplente: Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Novo Airão – STRNA); um representante de ONG ambientalista (titular: FVA, suplente: IPÊ); e um representante do setor empresarial (titular: Associação de Operadores de Barcos de Turismo do Amazonas – AOBT, suplente: Associação dos Piscicultores de Novo Airão – APINA).
Diversas comunidades ribeirinhas vivem nesta região e mantêm uma relação direta com o meio ambiente. O uso dos recursos naturais é baseado em um profundo conhecimento do ambiente, em que se denota uma forte dependência para suas atividades cotidianas, tais como agricultura, extrativismo, caça e pesca. Consequentemente, há uma relação direta dessas comunidades com as áreas protegidas do baixo rio Negro e seus recursos naturais.
Percebe-se que o envolvimento da sociedade local na gestão das áreas protegidas é fundamental para alcançar seus objetivos de criação, e que a integração entre elas trará benefícios a todos, visto que os gestores passarão a ter um olhar de conservação sobre todo o território, e não apenas aos limites das unidades de conservação. Com essa visão, será possível integrar atividades com vistas ao desenvolvimento socioeconômico, valorização do território e conservação da natureza e das paisagens do baixo rio Negro.Hoje o Baixo Rio Negro possui um fórum de articulação oficialmente reconhecido pelo MMA, que é o Conselho Consultivo do Mosaico de Áreas Protegidas do Baixo Rio Negro (Portaria N°. 483, de 14 de dezembro de 2010), que atua também como Sub- Região e Comitê Regional do Rio Negro, no âmbito do Corredor Central da Amazônia. Esse fórum paritário representa as diversas áreas protegidas do território e setores de atuação no baixo Rio Negro. O fortalecimento deste Conselho é entendido com um caminho estratégico para a promoção da integração da região.
No processo de integração das ações no âmbito do Mosaico, foi criado o Movimento Ajuri de Novo Airão, que envolve diversas instituições governamentais e não governamentais atuantes na região, com o objetivo de desenvolverem ações voltadas à conservação do meio ambiente e à educação ambiental. Fazem parte do “AJURI de Novo Airão” a Fundação Almerinda Malaquias, o IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Novo Airão, a Associação dos Artesãos de Novo Airão, o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Novo Airão, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, a Fundação Vitória Amazônica, o Centro Estadual de Unidades de Conservação, a Associação dos Pescadores de Novo Airão, a Maquira-RONA, a Associação Novo airãoense de Turismo, a Secretaria Municipal de Educação de Novo Airão e o Coletivo Jovem de Meio Ambiente de Novo Airão. O envolvimento da sociedade na gestão das áreas protegidas da região certamente poderá ser mais efetivo, quando a população compreender melhor seus objetivos de criação e se sentirem inseridas no processo. Neste sentido, o presente projeto tem por objetivo contribuir para o fortalecimento da gestão integrada e participativa do Mosaico de Áreas Protegidas do Baixo Rio Negro, por meio de informação/comunicação e apoio aos principais fóruns de articulação da região.
As comunidades tradicionais do Mosaico do Baixo rio Negro têm como principais atividades a pesca artesanal, Turismo, confecção de artesanatos, agricultura familiar, extração de castanha, copaíba, manejo florestal, etc...
Reconhece-se um potencial ainda inexplorado, nas seguintes atividades listadas abaixo:
a) Ecoturismo
• Potencial Ecoturístico pela beleza cênica e ecossistemas conservados, além da presença de populações tradicionais e indígenas. Existe infra-estrutura mínima instalada e baixa capacitação dos interessados pelo setor. O IPÊ possui um programa de “Ecoturismo com Bases Comunitárias” em andamento no entorno da ESEC de Anavilhanas.

b) Manejo Florestal

• O manejo florestal não-madeireiro e o madeireiro de pequena escala, correspondem a relevantes potenciais da região, a ser trabalhado com as populações locais. Existem na região espécies com bom valor econômico, que fornecem frutos, sementes, essências, gomas, fibras, etc. Necessita-se apoiar a organização social das comunidades e dos grupos produtivos, identificar áreas potenciais e densidade biológica, realizar estudos de mercado, trabalhar a questão do escoamento e comercialização, capacitar os interessados em manejo dos recursos naturais e necessidade de trabalho de educação ambiental.

c) Sistemas Agroflorestais

• Os Sistemas Agroflorestais, quando realizados através da idéia de adensamento de capoeiras, e na lógica da agroecologia familiar, pode favorecer o bem estar econômico e alimentar das populações locais, contribuindo para minimizar o impacto da agricultura sobre o solo e a floresta primária. Necessidade de acompanhamento de extensionista, de pesquisa básica, de educação ambiental e agroflorestal, estudos de mercados, trabalhar a questão do beneficiamento e da comercialização e escoamento.

d) Piscicultura

• A piscicultura apresenta-se como outro potencial econômico interessante para a região, este quando realizado em pequena escala, a nível comunitário, permitiria ganhos financeiros e alimentar. Necessidade de acompanhamento de extensionista, da realização de pesquisas, de educação ambiental, estudos de mercados, trabalhar a questão do beneficiamento e da comercialização e escoamento.

e) Artesanato

• O artesanato é intrínseco a cultura indígena e cabocla do baixo Rio Negro. Geralmente são utilizados materiais da floresta como fibras e sementes, para a confecção das artes. Necessidade de educação ambiental, estudos de mercados, trabalhar a questão do beneficiamento e da comercialização e escoamento, incentivo a criatividade e manejo dos recursos utilizados.

f) Conhecimento tradicional e Organização Social

• Encontra-se na região do mosaico um importante capital social, representado pelas populações ribeirinhas e indígenas que habitam esta área. Estas pessoas possuem conhecimentos aprofundados sobre os elementos e processos ecológicos da região, bem como utilizam técnicas de manejo bem adaptadas ao contexto ecossistêmico do Rio Negro, contribuindo para o desenvolvimento sustentável da região. Possuem grande potencial organizativo. Estas características devem ser consideradas, inseridas e potencializadas nos programas socioambientais, num contexto de diálogo de saberes.

g) Pesquisa Científica

• Realização de pesquisas sobre a ecologia da fauna e flora da região; sobre aspectos abióticos; pesquisa em etnobiologia, antropologia e sociologia; pesquisas econômicas; realização de monitoramentos.

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Organização sem fins lucrativos